UM MAL ESTAR DA CIVILIZAÇÃO: O OURO OLÍMPICO, A SAÚDE PÚBLICA E O ELDORADO DO FUNDO DO MAR.

A primeira página de O GLOBO de hoje nos informa que cada medalha olímpica obtida pela delegação brasileira em Pequim saiu a 53 milhões de reais. O gasto total da União com o evento esportivo internacional foi de 692,58 milhões. Empresas estatais como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Correios, Petrobrás, Eletrobrás e Infraero, juntas contribuiram com a gorda soma de 372,66 milhões. Reação: o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) pedirá abertura de CPI. A CPI das Olimpíadas. Os brasileiros não gostaram do resultado, mas o financiamento foi farto. Vamos falar de saúde pública. Muitos não gostam dos resultados, mas o financiamento ainda é uma questão em aberto. Estão, Estado e Sociedade a serem cobrados por essa omissão.

Foi objeto de um artigo aqui no Fax Sindical. O Ministro José Gomes Temporão propôs, no Rio de Janeiro, que o dinheiro arrecadado com os royalties do pré-sal fosse aplicado na saúde pública. Uma forma de resolver os graves problemas de financiamento que ameaçam cotidianamente a vida dos brasileiros, em especial da grande maioria que necessita do sistema público de saúde. Aguardamos a repercussão da manifestação do Sr. Ministro da Saúde. A Emenda da Saúde, Emenda Constitucional 29, EC-29 empacou no Congresso, depois de ter sido deturpada na Câmara dos Deputados. Agregaram-lhe uma reencarnação da monstruosa CPMF. A CPMF foi instituída pelos nossos legisladores sob o pretexto de atender à demanda de financiamento da saúde. Esse discurso foi ouvido por todos os brasileiros que não sofrem de problemas com a memória. E não atendeu a essa demanda. Muitos dizem que isso foi um estelionato político. O Ministro então, fechada a porta do agravo tributário (CPMF) e dificultado o caminho da EC-29, apresentou novamente a reivindicação nacional por financiamento da saúde em crise, também chamada apagão da saúde, no momento em que todos lançavam olhares cobiçosos sobre a imensa riqueza prometida pelo petróleo submerso.

Veja o artigo do Fax Sindical em: https://faxsindical.wordpress.com/2008/08/23/ministro-pede-royalties-de-petroleo-do-pre-sal-para-financiar-a-saude-publica/

As riquezas ainda hipotéticas das profundezas do mar estão sendo disputadíssimas. Há um verdadeiro furor arrecadatório em torno delas. Agora o presidente Lula veio dizer que a disputa está virando uma “farra”. Em matéria do Estado de São Paulo de hoje: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20080824/not_imp229767,0.php

A matéria “Lula quer controlar uso dos royalties” vai assinada por Lu Aiko Otta e Vera Rosa. Fala do debate iniciado no Governo pelas riquezas do novo Eldorado abissal e da necessidade de fixar regras para o gasto dessa riqueza.

“É preciso estabelecer uma disciplina para usar os recursos”, disse ao Estado o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. “Não podemos nos comportar como novos ricos e sair por aí torrando o dinheiro.”

Citam um estudo da Universidade Cândido Mendes que, na maioria dos casos, os municípios beneficados pelos royalties petrolíferos os gastam em contratação de servidores públicos e repasses de dinheiro a ONGs ligadas a políticos próximos aos hóspedes do poder. Um professor da Universidade que realizou as pesquisas declara que essa receita é finita. Fato científico, mas que não faz parte dos cálculos de políticos cujo universo mental vai apenas até as próximas eleições.

No Governo, a idéia é carimbar os recursos, para que se evitem disputas e desperdícios. Pelo menos é o que declara o Ministro José Múcio, do PMDB, que responde pela articulação institucional. Ele lembra da demanda da área social que inclui a seguridade social e, por isso, os serviços públicos de saúde. Parlamentares como Delcídio Amaral (PT-MT) e Aloísio Mercadante (PT-SP) citados na matéria, criticam a forma como os municípios beneficiários dos royalties gastam o dinheiro, citando genericamente a folha de pagamento (sem especificar o erro de gastos com gestão de pessoas) e iniciativas bizarras como calçamentos de granito ou falta de benefício para as populações. Na verdade esse discurso é perigoso. Esconde a centralização administrativa, a vontade de encher mais ainda os cofres de Brasília e relegar, cada vez mais, os municípios brasileiros à condição de pedintes. Lembramos que uma das tarefas mais importantes da República, o cuidado com a saúde da população desassistida, foi entregue ao municípios no processo de municipalização construído pelo SUS.

A matéria ainda nos informa que o presidente Lula quer fortalecer a educação e a idéia é que o dinheiro não possa ser usado em gastos correntes, como folhas de pagamento, mas em investimentos. A equipe econômica, pela voz do ministro Mantega (PT-SP) quer o dinheiro para o seu Fundo Soberano (de soberbo nome). Já o ministro da Defesa Jobim (PMDB-RS) torna-se porta-voz das reivindicações militares sobre a necessidade de reequipar as Forças Armadas, tornando-as contemporâneas.

O pleito do Temporão, pelo jeito não foi considerada. Não se lê nada a respeito nessa matéria do Estadão. Tomo isso como mais um exemplo da acomodação geral dos políticos eleitos para com as dificuldades dos negócios públicos da saúde no Brasil. O assunto, pela sua gravidade, merece reflexão. Vamos a alguns pontos que, salvo melhor juízo, são tidos como certos:

1-A saúde, a assistência médica oferecida pelo serviço público no Brasil, está sempre entre as maiores preocupações das pessoas. O atestam pesquisas de opinião frequentemente publicadas.

2-A saúde pública faz parte, frequentemente, do debate político eleitoral. Geralmente não abordada de forma satisfatória, mas cheia de promessas.

3-Um governante, qualquer que seja sua origem e orientação, não governa apenas para a saúde, mas deve ser sensível aos seus problemas, que são uma parte importante dos negócios públicos. Em alguns municípios a saúde ocupa um ponto central nos seus orçamentos debilitados.

4-Muitos brasileiros esclarecidos, formadores de opinião, pesquisadores e cientistas sabem das deficiências que o país tem quando se trata de financiamento e gestão da saúde.

5-Médicos, representados pela sua representação classista, que são os sindicatos e federações, e por associações profissionais e conselhos profissionais, tem reivindicado a necessidade de uma política justa de gestão de pessoas, que contemple valores condignos para a remuneração dos profissionais, condizentes com o mercado e cause motivação e interesse crescente pelas atividades próprias do serviço público na área de saúde.

Apesar dessa realidade, da presença intensa e robusta da saúde nos debates eleitorais, da preocupação constante com os negócios públicos da saúde expressa em pesquisas de opinião, a humilde sugestão do ministro Temporão não repercutiu.

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